Gestão de segurança e competências pessoais em atmosferas explosivas – Parte 01/03

Em 04/08/2020 foi registrada no Porto de Beirute, no Líbano, uma grande explosão, resultante da ignição de cerca de 2.750 toneladas de nitrato de amônio, material explosivo utilizado como fertilizante agrícola. As causas da explosão estão sendo investigadas, tendo sido identificado por imagens de vídeo que um incêndio foi iniciado antes da explosão, em um dos armazéns próximos. Estas imagens de vídeo mostram duas explosões, uma inicial, de menor intensidade, seguida de outra, de grandes proporções, que destruiu uma grande parte da zona portuária e dos edifícios da capital libanesa.

Esta grande explosão, que causou a morte de mais de 200 pessoas, foi equivalente a um terremoto de escala 3.3 ou de uma explosão de 1.000 toneladas de TNT (dinamite), criando uma cratera com aproximadamente 140 metros de extensão no local do armazenamento, tendo sido ouvida a cerca de 200 km do local, no Chipre.

O nitrato de amônio (NH4NO3), com número Nº CAS (Chemical Abstracts Service) 6484-52-2, fabricada industrialmente, não é uma substância combustível. Ele não gera vapores combustíveis como a gasolina, que podem formar atmosferas explosivas. O nitrato de amônio se decompõe, e, ao se decompor, ele produz uma série de gases. Esses gases, quando aquecidos até a sua temperatura de decomposição (acima de 180 °C), rapidamente se expandem e explodem.

No caso das instalações do porto de Beirute, desde 2014, inspeções realizadas no local já haviam registrado que cerca de 1950 sacos do total de 2 750 sacos de nitrato de amônio que se encontravam no armazém estavam rasgados, indevidamente empilhados uns sobre os outros e apresentando grandes vazamentos de produto. Isto pode ser ocorrido desde 2013, data do seu armazenamento, em função da absorção de umidade e gradual cristalização do nitrato de amônio, com a sua consequente expansão e ruptura dos sacos. É provável que o incêndio inicial mostrado em imagens de vídeo tenha sido a fonte de energia de ignição que provocou a explosão do produto. Neste acidente, uma das primeiras observações é a grave falta de procedimentos de manutenção e de segurança no armazém onde este produto se encontrava armazenado há seis anos. Outras grandes explosões já foram registradas em locais de armazenamento de grandes quantidades de nitrato de amônio, como por exemplo em 1947, no Texas, em um local com 2.000 toneladas, causando a morte de 581 pessoas e mais recentemente na China, em 2015, com a morte de 173 pessoas. Este tipo de explosão serve para alertar sobre a necessidade do pessoal envolvido com a produção, processamento ou armazenagem deste tipo de produto ser devidamente treinado, de forma a possuir a necessária percepção dos riscos existentes nestes locais. Em áreas portuárias de armazenamento de grandes quantidades de produtos inflamáveis ou combustíveis, como em grandes armazéns de armazenamento de  açúcar ou de fertilizantes, ou em grandes silos de armazenamento de soja, milho ou trigo, já foram registradas grandes explosões, em função da presença simultânea nestes locais de poeiras combustíveis e de fontes de ignição (como execução de trabalhos de manutenção ou de soldagem ou de falhas dos equipamentos elétricos ou mecânicos).

Existem Instruções Técnicas dos Corpos de Bombeiros de diversos estados do Brasil que tratam especificamente deste assunto, com requisitos para classificação de áreas contendo poeiras combustíveis, especificação de equipamentos elétricos “Ex” certificados, especificação para equipamentos mecânicos não centelhantes (como moegas, esteiras transportadoras e elevador de canecas), sistemas de detecção e alarme de incêndio, sistemas de alívio de explosão, bem como de procedimentos de trabalho para limpeza dos locais e procedimentos de segurança que evitem a geração ou o acumulo de cargas eletrostáticas.

Pode ser feito neste caso um comparativo com os requisitos aplicados aos equipamentos de processo, como os vasos de pressão, que são especificados na Norma Regulamentadora NR 13 – Caldeiras e vasos de pressão. Para atendimento da NR 13 e dos respectivos prazos de parada periódica para inspeção e manutenção, muitas empresas optam em possuir um SPIE (Sistema Próprio de Inspeção de Equipamentos), que passam periodicamente por processo de avaliação e de auditorias externas.

A existência de um SPIE faz com que o acompanhamento contínuo das caldeiras e dos vasos de pressão representados pelos equipamentos de processo permita um maior intervalo entre as paradas programadas para as inspeções e manutenção. Desta forma, na área de atmosferas explosivas a necessidade é que haja também um tipo de SPIE “Ex”, representado também por um sistema eletrônico de cadastro, programação de inspeções, acompanhamento, inspeções periódicas e manutenção dos equipamentos “Ex”, de forma a assegurar que estes equipamentos estejam devidamente instalados, mantidos ou reparados, ao longo do seu “ciclo total de vida”.

Com base neste sistema de gestão de ativos “Ex” é possível haver uma confiança de que os equipamentos “Ex” não representam uma fonte de ignição e que não haverá uma explosão em uma eventualidade de liberação inesperada de gases inflamáveis ou de poeiras combustíveis devido à eventuais perda de contenção por parte dos equipamentos de processo e vasos de pressão.

Se por um lado o SPIE assegura a integridade física das caldeiras, vasos de pressão e dos equipamentos de processo (como vasos, tanques, fornos, caldeiras, reatores e torres de destilação) evitando a liberação de gases inflamáveis ou poeiras combustíveis para o meio ambiente, o SPIE “Ex” pode assegurar a integridade dos equipamentos e instalações “Ex”, de forma a não representarem fontes de ignição capazes de causar uma explosão, caso haja falha de algum equipamento de processo, com perda de sua capacidade de contenção e  a consequente formação de uma atmosfera explosiva.

Uma situação possível para atender estes requisitos mútuos de segurança seria se o próprio sistema SPIE existente, que é aplicável a equipamentos de caldeiraria tivesse seu escopo ampliado, de forma a abranger também o cadastro, controle e a inspeção periódica dos equipamentos elétricos, de instrumentação, de automação, de telecomunicações e mecânicos “Ex”.

Para a obtenção dos níveis necessários de  segurança  nas  instalações  elétricas,  de instrumentação, de automação, de telecomunicações e mecânicas em atmosferas explosivas, é necessário que sejam adequadamente realizadas atividades, as quais dependem dos treinamentos, experiências, habilidades, qualificações e competências das pessoas envolvidas na execução de tais trabalhos.

Os trabalhos relacionados com instalações elétricas e mecânicas em atmosferas explosivas representam uma área específica e particular, diferente das atividades relacionadas com  os serviços prestados para as  instalações na indústria de um modo geral, em áreas não classificadas. Esta particularidade se deve ao fato de que os grandes riscos de explosões ocorrem predominantemente em áreas contendo atmosferas explosivas, resultando em consequências potencialmente catastróficas para as instalações e o meio ambiente, incluindo a possibilidade de perda de vidas dos que estejam no local e da comunidade existente nas proximidades da explosão.

As particularidades dos requisitos de segurança de equipamentos,  instalações e serviços para estas áreas “Ex” estão especificados em normas técnicas brasileiras adotadas das séries ABNT NBR IEC 60079 (Atmosferas explosivas) e ABNT NBR ISO 80079 (Equipamentos mecânicos “Ex”), elaboradas pelas Comissões de  Estudo do Subcomitê SCB 003:031 (Atmosferas explosivas) da ABNT/CB-003 (Eletricidade) e publicadas pela ABNT, que são totalmente harmonizadas com as respectivas normas técnicas internacionais.

No entanto, de uma forma geral, pode ser verificado nas instalações que possuem áreas classificadas contendo gases inflamáveis ou poeiras combustíveis, que as empresas de serviços de projeto, montagem, inspeção, manutenção e reparos, apresentam deficiências de competências do pessoal envolvido com execução e supervisão, os quais não possuem as devidas experiências, conhecimentos e habilidades, que os tornem competentes para atuarem com o desempenho e segurança necessários, nas atividades para as quais são solicitados.

É comum a verificação de serviços de projetos, montagem, inspeções, manutenção e reparos envolvendo instalações elétricas e mecânicas em atmosferas explosivas, que não atendem aos requisitos normativos indicados nas respectivas partes das normas das séries ABNT NBR IEC 60079 e ABNT NBR ISO 80079.

Fonte: https://www.osetoreletrico.com.br/gestao-de-seguranca-e-competencias-pessoais-em-atmosferas-explosivas-parte-01-03/

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